quinta-feira, 7 de outubro de 2021

Que experiências estamos tendo através das marcas que compramos?

 

Que a pandemia mudou o entendimento do consumo e a forma de fazê-lo, já estamos carecas de saber. Quem nunca havia comprado pela Internet antes do vírus aparecer, provavelmente  começou a fazê-lo ou, no mínimo, a considerar tal possibilidade. É um caminho sem volta, mesmo para quem resiste às novas tecnologias. A migração online foi um dos principais motivos para o impressionante crescimento do e-commerce.



Segundo a Infomoney, só em 2020 as vendas no varejo digital cresceram 41%! No entanto, alguns hábitos de consumo foram modificados e ainda estão se adaptando: nem tudo que é percebido no ponto físico é igual no digital, o que não significa que seja melhor ou pior. É apenas diferente e vai envolver outros sentidos. Você não consegue tocar na roupa que está comprando num aplicativo, por exemplo, mas consegue vê-la (se tiver boas imagens) e saber suas principais características, desde que as informações estejam disponibilizadas de forma simples e acessível, incluindo a possibilidade de troca. Essa, aliás, costuma dar muita dor de cabeça, não é mesmo?



Ofereça-me uma boa experiência e te serei fiel

Fidelizar clientes é uma arte, não conheço quem não valorize as lojas ou marcas que resolvem problemas, de forma verdadeira e amigável. O cliente quer atenção nesse mundo de bombardeio publicitário e promessas não cumpridas. As decisões de compra em relação às marcas são baseadas na soma das experiências que temos no atendimento presencial, na ligação, e-mail, site, etc. Lojistas e seus colaboradores precisam estar atentos para não extrapolar na aproximação empurrando mercadorias que sequer foram consultadas, sem invadir o WhatsApp alheio. É preciso um contato anterior e consentimento prévio antes de disparar mensagens com ofertas ou promoções, isso faz parte da etiqueta digital. Na vida pessoal? Bem, cada um deve saber seu grau de exposição nas redes,  não é mesmo?


Voltando aos negócios, sabemos que os estoques precisam girar mas há um limite ético, e ele é determinado pelo bom senso. No mesmo sentido, quem atende nos dois ambientes, físico e digital, precisa proporcionar uma experiência única e integrada, já que a alternância nos formatos de atendimento não pode ter atritos, devendo ser agradável em qualquer ponto de contato com o cliente. Falo por mim: quando me deixam no vácuo, sem responder a pergunta que fiz no Instagram, fico realmente irritada, pois isto é o mínimo que a marca deveria fazer: responder. Já passo para outra no ato, há tantas opções e ninguém tem tempo a perder. Quem vende produtos ou serviços no Instagram precisa colocar alguém atento para interagir com os seguidores, ou não tenha perfil comercial na rede social se não sabe usá-la profissionalmente. Presença digital precisa ser real. #ficaadica


Não adianta acompanhar métricas e não fazer nada com os dados levantados

Já sabemos que o cliente cada vez mais exige a chamada “one single and valuable experience” (uma única e valiosa experiência). Ou seja, que a qualidade se mantenha a mesma independente do canal utilizado. Porém, não adianta discutir os números e as métricas das redes sociais sem um olhar humanizado e empático para quem está comprando, como e porquê. É imprescindível olhar, ler e escutar as pessoas, entender realmente o que querem, questionam ou precisam. Não se trata de só bater a meta de venda daquele dia, mas sim oferecer a melhor solução baseada em empatia, paciência, generosidade, acolhimento. Tudo isso sem pressão, construindo o relacionamento e ganhando a confiança, priorizando sempre o atendimento de excelência.



Treinamento e conversas constantes com as equipes de venda são indispensáveis, o cliente percebe claramente um atendimento qualificado e responde positivamente a isso. O próprio WhatsApp, já mencionado aqui, tem sido um fator interessante quando bem utilizado, de forma não invasiva. Seu crescimento importante, não só na parte de atendimento, mas também de venda, deve-se à interação mais próxima e individualizada entre o consumidor e o vendedor, mesmo com a opção de comprar on line e retirar o produto na loja física, envolvendo diferentes atendimentos mas integrados, o que evidencia a experiência phygital na prática.

 

3 dicas para não derrapar na Etiqueta On Line:

Ainda que as pessoas queiram simplicidade, rapidez, conveniência e uma “âncora emocional” para se sentirem apoiadas na compra por aplicativos de mensagem, essas regrinhas valem ouro:

1-      Se vai conversar pela primeira vez com a pessoa, peça licença e se apresente, diga qual estabelecimento comercial você representa e se ela concorda em receber suas promoções, ofertas ou catálogos. Evite copiar e colar textos engessados ou impessoais e chame a pessoa pelo nome. Ninguém quer ser mais um na fila do pão...

2-      Jamais entre em contato fora do horário comercial, em finais de semana ou feriados. Respeite a privacidade e o descanso do cliente. Caso receba um “gelo”, não insista, a decisão de seguir na conversa é do cliente. Se insistir, você será bloqueado e a imagem da loja/marca ficará associada a uma má experiência.

3-      O audio é prático, mas é para amigos, e nem sempre quem está do outro lado pode ouvir. Opte por textos e imagens mas se o cliente responder com um áudio, está sinalizando que a conversa pode seguir em frente dessa forma.

 

OBS. Usando com moderação, objetividade, bom senso e respeito, o WhatsApp e qualquer outra forma de comunicação podem ser aliados de venda, mas é uma via de mão dupla. Você também não quer ficar 2 horas pendurado numa ligação ouvindo sobre a vida amorosa do cliente que está em dúvida se compra ou não a cama de casal nova...

Até a próxima!

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

 

Um shopping de usados onde a novidade é a consciência!

Quando pensamos no conceito de fim da vida útil de um produto (qualquer produto, não pense só na moda, mas em tudo o que você consome no seu dia-a-dia), é preciso vencer o estágio atual do “pegar-usar-descartar”, da chamada economia linear, e pensar numa abordagem mais holística: será que esses produtos poderiam ter mais de uma vida? E se eles não fossem considerados lixo e virassem insumo ou nutriente para uma nova cadeia, ou um novo ciclo? E se trocassem de dono após serem reparados ou transformados? Para evoluirmos nesse novo estágio de aproveitar melhor os recursos, que não são infinitos, precisamos de um sistema integrador e regenerativo que faça valer a economia circular, tema muito explorado no livro Cradle to Cradle*, com o mantra “criar e reciclar ilimitadamente”.

Ciclo de vida

Não seria ótimo se os recursos tivessem possibilidade de não se perderem em aterros sanitários ou incineradoras, gerando perda financeira e poluição, estando aptos a “voltar ao jogo”? Se pensarmos no vestuário, precisamos entender que as soluções para o fim da vida útil devem ser integradas durante todo seu ciclo de vida (pense nas suas roupas e calçados, o que você faz com elas quando as enjoa ou não as quer mais?), desde o design e a fabricação, passando pelo marketing, varejo e serviços, até a ajudar os consumidores a prolongarem o uso de suas roupas por meio de reparos, ajustes, esquemas de devolução, revenda, compartilhamento, reuso e opções de reaproveitamento. Escolhas de material no estágio de design desempenham importante papel em soluções para o fim da vida útil, já que materiais de baixa qualidade e materiais mistos que atualmente dominam a produção têxtil trazem consideráveis desafios tecnológicos em opções de reciclagem viáveis. Se entendermos que a roupa mais sustentável do mundo é a que já existe, talvez estejamos mais perto de uma solução, ao invés de só criarmos o problema.

Recursos não são infinitos

Este é um tema muito discutido na atualidade, com tanto desperdício de recursos preciosos e também porque exige-se um esforço coletivo para uma real mudança de paradigma, onde todos devem fazer a sua parte para um desenvolvimento sustentável nos negócios, sem prescindir do papel dos consumidores e suas demandas por produtos e serviços que se posicionem de forma positiva dentro dos pilares ambiental, social e econômico. Já existem muitas marcas, lojas e instituições atentas à política dos Rs (reduzir, repensar, reparar, reusar, ressignificar, reciclar...), algumas mais no discurso do que nas ações, verdade seja dita, mas percebe-se cada vez mais a aceitação do público a essas novas formas de valorizar e recomercializar o que já existe. Um bom exemplo disso é um shopping que foi lançado em 2015, inteiramente de coisas usadas, e que faz o maior sucesso. Ele próprio foi construído com materiais de construção de segunda mão. Localizado na Suécia, o ReTuna, é totalmente dedicado a dar vida nova a itens usados de moda, decoração e mobiliário. Localizado a uma hora de viagem de Estocolmo, na cidade de Eskilstuna, consiste em 14 lojas espalhadas por 5 mil m², empregando entre 50 e 65 pessoas. ReTuna foi uma brincadeira com o nome da cidade industrial Eskilstuna, que desde a década de 1990 se esforça para se tornar uma cidade sustentável. O @retuna_aterbruksgalleria foi, inclusive, eleito o primeiro shopping center do mundo designado para itens consertados, reciclados e restaurados, pelo Livro Guinness dos Recordes Mundiais em 2020. Atraindo cerca de 250.000 a 300.000 visitantes por ano, possui dois andares de lojas que vendem gadgets de tecnologia usados, livros, brinquedos infantis, artigos domésticos, e roupas, é claro. Como esses modelos de negócio requerem educação para produção e consumo mais conscientes, o shopping também oferece um curso de um ano em design de produtos reciclados, recebendo itens passíveis de recuperação ou restauração para a estação de retorno, previamente separados e categorizados. A partir dessa “curadoria”, eles são consertados, reparados ou transformados para serem vendidos no shopping, com base no plano de negócios de cada loja. O objetivo é explorar uma nova forma de fazer compras que resulte em menos danos ao meio ambiente. Todas as lojas no shopping devem operar de maneira ecologicamente correta e, se tiverem de comprar novos produtos - como café -, os itens devem ser orgânicos ou sustentáveis. Quem entrar no site do shopping lerá que “Sustentabilidade não é segurar e viver menos - mas conseguir mais com os recursos que já temos”.

Nivel de consciência aumentou

As compras em segunda mão aumentaram na Suécia, onde o “kopskam” (vergonha de comprar) e o “flygskam” (vergonha de voar) estão pesando na consciência dos suecos. O país pretende ser um líder ecológico tornando-se neutro em carbono até 2045, e Eskilstuna deseja ser independente de combustíveis fósseis. Equipada com uma central de coleta seletiva de última geração, a cidade já recicla ou transforma a maior parte de seus resíduos em energia. Mas a imagem verde tem algumas manchas. Carros lotam as ruas e estacionamentos da cidade, incluindo o estacionamento do ReTuna. Embora os ônibus do centro da cidade já operem com biogás, ainda há muito a fazer para reduzir as emissões de dióxido de carbono. Nada é perfeito e o caminho está em construção, mas a cidade luta para o desenvolvimento de energias renováveis ​e ampliação de ciclovias. Realmente é bastante complexo, mas as metas são ambiciosas e o importante é fazer algo. Falar, todos falam, está na hora de arregaçar as mangas e agir. Essas iniciativas e modelos de negócio engajados merecem reconhecimento e nos dão boas ideias para replicarmos por aqui também.

 

                               ReTuna em Eskilstuna, Suécia (Foto: @retuna_aterbruksgalleria)

 

Até a próxima!

Madeleine Muller

 

Fonte: Prestigeonline.com

Esta coluna foi originalmente postada no Bella+:Madeleine Muller (correiodopovo.com.br)

Cradle to Cradle* é um livro lançado em 2009 por Willian Mcdonough e Michael Braungart